Já
é Primavera, num Portugal tomado pela gentileza de ser. Não sei como lhe
chamar. Se largo, praceta ou uma rua enviesada. Mas cumpre a função, seja qual
for o nome que lhe dão. Nesta cidade de gente nova a passear as roupas
despidas, a meia-idade não tem trejeitos à vista. Guarda-os no sossego da sala
de estar do apartamento que ainda paga ou no baile de esperança e expectativa,
cujo propósito é juntar os divorciados e os viúvos da zona. E dos arredores.
Ou, se permitirmos, é tudo mentira. Fatal utopia, a de antecipar a vida alheia.
Sinto-me visita quando volto. Por certo, porque nunca fui senão visitante com
curiosidade e paixão. Por ser impossível, não esqueço um lugar como este. Onde
as tradições nacionais e regionais ainda existem, mas vão falecendo. Tão moribundas
como as ruas numa hora vazia. Lá, onde vestir bem e sair para a rua, parece ter
um duplo sentido. Desassossegam-se as almas exânimes, tomando fulgor de última
temporada. Depois de levar o corpo pela cidade, volto à praça pequena ou rua
sem entrada. Fica lá, qual majestade, a padaria. Das antigas, onde o nome do
fundador é história relevante. No cimo de uma das portas principais, lá está o
nome cravado. Entrei e falavam de idade e do peso de não conseguir contrariar
os declínios. Estava, daí a conversa, uma senhora de noventa e quatro anos ao
balcão. Um charme. Quando existe, não morre. Jamais. A minha mãe lembrou a
minha avó. Viva e tão apta. À saída, a mesma senhora. Ajudamo-la. – Obrigada,
meus queridos. A figura tão torpe que uma velha consegue fazer. Obrigada e
perdoem-me a desfeita. – Sorrimos. Antecipou um pensamento. Felizmente, em
tempo algum, poder-nos-ia invadir a lembrança. Tenha um bom dia. Até qualquer
outro.
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