27.4.15

Português revolto.

Sexta-feira, vinte e quatro de Abril, tarde coberta, céu acinzentado, nuvens zangadas. Ouvem-se gritos e passos desassossegados, fazendo imaginar um grupo largo de crianças. Abordam os transeuntes, dão-lhes algo. Entram em espaços de negócio e voltam para a rua de mãos vazias. Chegam perto de nós e percebemos, estão a distribuir a simplicidade e a liberdade em pequenos papéis. Cada um, uma frase, um destino sem volta. Verdades sem contra-argumentação. No que me ofereceram, podia ler-se: “A liberdade tem de ser respeitada”. Noutros, a alusão ao actual quotidiano das massas. Ainda divertidos cravos feitos à mão. Justiça, era a palavra escolhida. Não sei, mas pelos relatos que vou ouvindo, pelo que vou lendo e, acima de tudo, pelo que vou procurando saber, a noite que antecede o dia lembrado é, sem pensar, esquecida. A emoção, a comoção, a vontade da revolução vividas na pele. Tudo deve ter ultrapassado os poemas que têm paciência ou os que matam em cada verso. Zeca Afonso cantou a intervenção política. Por mais anos que passem, o vinte e cinco de Abril será, vezes sem conta, o maior e melhor pretexto para lembrar a flor da revolução, encher as ruas e as avenidas com vontade de comemorar o que passou, mas com mais e ferozes ganas de limar o presente e ultrapassar o desgoverno, com a necessidade de alicerçar um futuro próspero, condizente com a estrutura ambiciosa e criativa de mil novecentos e setenta e quatro. Nunca esquecer a educação, a formação. Volvidos estes quarenta e um anos, é impossível não rever a democracia e não pensar no quão embrionária é no nosso país. Sossegada, por força dos inexperientes que brincam ao faz de conta. Talvez não seja como nós queremos. Mas desligar e deixar andar, não é a razão dos sentidos.

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