Chove
e está frio lá fora, como se fez rotina todo o tempo invernoso. O céu num
cinzento translúcido, passa uma luz baça. As janelas encostadas. Nos vidros,
toca miudinha. Há um indescritível desconforto. Próprio da época e do ambiente.
Há chapéus-de-chuva a descansar. Uma televisão ao fundo, sem som, passa um
programa estrangeiro. Há casacos e sobretudos vestidos. É tão ingrato como absolutamente
devastador ouvir uma mãe e um avô relatarem na primeira pessoa a violência e o
desequilíbrio exercidos sobre alguém que lhes pertence tão umbilicalmente. Por
força de um homem que suporta e desagua as frustrações, o rancor, a impaciência
e a maldade tão patológica, numa jovem mulher que, embrulhada em medo, leva a
educação da filha a bom porto. Uma jovem mulher que se faz forte, mas quebra no
momento do confronto. Porque o medo, dizem-me, é superior a qualquer convicção
e determinação. Porque uma família inteira vive no desajuste e no tremor do que
vem aí. Do que, a vir, lhes possa roubar. E fico sempre miúdo, quando ouço
relatos destes. Porque arrepia, só no hipotético, o terror em que uma vida se
torna, por força da delinquência e perversidade de alguém. Não pode ser. Não
pode. Quão arrepiante é ver e ouvir o medo de alguém.
Faz-nos sentir pequeninos não é?
ResponderEliminarvês agora porque evito ver noticias e afins??
porque me transtorna e dá-me volta ao estômago...
não há como ser indiferente a estas noticias... não há....
Beijinhosss Real :)
Nos Entas,
ResponderEliminarPrecisamente. Ganhamos outra escala. Tudo toma outras dimensões.
Eu vejo notícias, quando possível, embora, nos últimos tempos tenha despendido menos tempo.
Ganha outro sentido, quando nos contam na primeira pessoa. Não consigo explicar como fico, sendo que não é a primeira vez, quando ouço relatos, de viva voz, mesmo à minha frente, com os olhos carregados de lágrimas a olharem os meus, enquanto me relatam a angústia e o medo. Não entendo. Não há explicação.
Beijinhos.
Não consigo dedicar-me a ver essas notícias, o desejo de fugir é mais forte do que eu. É certo que devemos conhecer a face do outro, daquele que sofre, porque nos permite ver a vida noutra perspectiva, mas há coisas que não consigo mesmo. O medo é demasiado forte para as minhas emoções.
ResponderEliminarbeijo
Raquel,
ResponderEliminarEntendo o afastamento que essas notícias provocam. De resto, tantas vezes, faço por me distanciar um pouco, também. Não é uma alienação provocada. É, antes, uma dor e um medo que assustam, só de ouvir contar. Depois, pela segunda vez, já estive frente-a-frente com familiares de mulheres agredidas, que me relataram. É maior do que possamos imaginar. É impossível descrever o arrepio. Beijo :)