Julgo
ter visto o Pai Natal. O tempo não tem pausa. E, permitam-me a infantil necessidade
de me lembrar e, por força, fazer referência ao excelso trava-línguas – O tempo
perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem - Ano de velhos relhos. Relhos
ligados de emoções, desligadas as famílias, que se distanciam. A facilidade de
depositar algures, na promessa de regressar em breve. Na boca a conversa de que
não se ajeitam as condições de os receber. Esta manhã tive oportunidade de
estar algum tempo num hospital. É público, mas podia tratar-se de um outro
regime. E perde-se o juízo na soma do homem com o abandono. Ludibriam-se vidas
e ocupações para justificar ausências e severas acções. Quem persiste, resiste.
Quem ama, cuida e rega sob e sobre tudo e todos. Aflição é pensar no que foste,
em quem és. Para onde vais. Sufocam-se as vozes daqueles velhos de cama em
cama. Voltam sempre mas nem ao telefone lhes ouvem as vozes. Não resisto
pensar, dá Deus nozes a quem não tem dentes. Desabafo de um relho homem.
Imitava um passeio num corredor de pouca luz. Na cadeira de rodas seguia de
sorriso agitado. As barbas compridas e brancas. O porte típico de quem tem
carnes. É o Pai Natal. Foi, no exacto instante em que vi, o que me assaltou a
ideia. Suportei as minhas desconfianças depois de o ouvir contar vidas. Julgo
ter visto o Pai Natal. Num corredor de hospital, com uma bata clara e um frasco
de soro ao lado. Quando nem o Pai Natal tem quem o sufoque de mimos e
companhia, mal vai o mundo. Um mundo que é uma caixa onde se esconde o pior no
fundo.
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