O
natal, há pouco, vestia as paredes frias. A rua vai dando aos transeuntes o que
o comum cidadão procura. Uma apropriada bola de neve. As caras dos espectadores
acompanham a magia numa ficção pintalgada. As bocas brincam como fantoches
comandados. É engraçado pensar. As fotografias da rotina acontecem em cada
esquina. É engraçado não reparar. Damos, de novo, prioridade aos passos. Vamos
lá, há mais para contar. Quanto mais acentuada é a falta de sentido, mas
atraente. Quanto mais ausente é a monotonia e o comportamento amorfo, melhor e
vencedor. Entre a secção dos enlatados e a barreira das massas, antes de
vislumbrar a banca dos frescos e de piscar o olho aos brinquedos, há uma menina
cantadeira. Tem tom de rouxinol, timbre de fada madrinha. Inventa a letra,
canta como se estivesse na luz de um palco rei. Inventa o público eufórico,
esgotado mas firme. Se ficarmos ali, com atenção, ouvem-se os aplausos. Os
gritos fortes, em uníssono. A menina canta, soa a qualquer coisa. Ficar e
escutar não é opção, é a força da razão. A boca tem vida, as cordas vocais não
têm receio. Imagino-as num bailado sem fim. Numa corrida sem precedente. Que
espectáculo graúdo. Voz de supermercado, canção de menina sem pecado. Na mão um
pai natal luminoso é o perfeito microfone mimoso. Pelo meio do palavreado
seguido, percebe-se a alusão à época. A festa da gente, a razão da família.
Entre o atum acondicionado e a esparguete em exposição, canta a menina de voz
doce. A canção de supermercado. O natal vive em qualquer um, vive em qualquer
lado.
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