12.5.15

Mulher que se foi libertando das pressões burguesas.

A vida é bela, rapaz. Volto a lembrar-me de um dos filmes que mais gostei, pelas tantas razões que hei-de sempre lembrar. Que, por ora, nada importam. Passei, entre outras coisas, o gosto pelo filme à minha irmã mais nova. Lembram-se as gerações de que viver em harmonia nem sempre é fácil. Arrumam-se os livros de história, esquecem-se as tradições regionais, afastam-se os mais velhos, destroem-se as praias porque ganharam títulos, compilam-se em discos externos as fotografias, consome-se até à exaustão a música comercial. Nunca mais voltámos a eles. A facilidade e a rapidez comandam ao nível da ambição. A vida é bela. É nome de filme, volto a lembrar e é uma espécie de sonho, uma utopia que tem jeito de petiz travesso. Como aquela sala, outrora cheia de gente ansiosa pela orquestra imaculada, bem comandada e pela voz que viria depois. Os camarotes, reis da vista privilegiada. Agora, vazia e com uma acústica excepcional, esta sala é espaço de conversa. Logo à noite, apresentar-se-ão películas datadas. Neste instante, a sala está despida de gente ansiosa e do burburinho que especula sobre o que está a estrear. Agora, senta-se e somos todos ouvidos. Estes quase noventa anos são a prova viva, guardada e pronta para passar para uma prosa valente e inquietante, um Portugal de outros. O dela, por certo. Estes quase noventa anos lamentam a sala vazia, nunca de público, mas de obras, de óperas, da arte que merece ter tábuas para pisar. Tem um humor particular, sorri com o rosto todo, mostra legitimidade e coerência no discurso e, ainda mais, nos lamentos. Os brincos grandes fazem a moldura. As mãos marcadas brincam com o fio que pende sobre o peito. Não pede mais oportunidades, porque já não interessa. Aproveitou todas as que lhe fizeram parar e suspirar. Hoje, pede a dignidade e a classe que a permita, nunca quando lhe apetecer, mas sempre que surgir um cartaz à porta, para sair de casa, bem vestida, disponível para passar um bom bocado. E, no final, aplaudir. Se preciso, de pé. Palmas.

2 comentários:

  1. A idade é um posto, sem dúvida. O que eu gostava de ficar a ouvir as histórias da minha avó.

    A vida é bela é simplesmente genial.
    (e, sim, estou a falar do filme. que a minha vida não é assim tão bela, muito menos genial. ;) )

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    1. Mam'Zelle Moustache,
      Totalmente de acordo. A idade merece-nos todo o respeito e devida atenção. Eu, felizmente, ainda tenho uma avó com quem partilhar essas vivências e escutar-lhe as histórias. Do seu tempo, como quase sempre começam.

      Estamos equiparados, portanto. Que a minha também não tem esse título, nem nos jeitos nem nos trejeitos. Vale-nos o filme, então ;)

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