24.9.15

Expressão de despedida.

O ambiente é pesado, não fosse o descanso eterno um adeus. Sem sobressaltos que venham a seguir. Um ponto final. Sem margem para dúvidas, não raras vezes, um ponto final precoce. Antes do tempo certo. Como se o tempo tivesse essa contabilidade. O ambiente é pesado, não fosse a igreja imponente, idealmente escolhida. Os dourados sobre o branco e a pedra. O frio quase inerente. As vestes elegantes no altar. As imagens à volta. As flores em jeito de homenagem. A cerimónia fúnebre. O peso nos rostos. Da primeira fila à última. O silêncio meio atrofiado. Como se este fosse, assim sem que nos apercebamos, roubado pelo barulho de um género de brisa. A porta da igreja totalmente aberta, deixando o convite. Entra luz por todos os lados. Os tectos trabalhados ganham outra vida. Escondem-se os olhos, desde logo as emoções, atrás de uns óculos escuros. Cumprimentos de quem não vê caras, mas lembra nomes e laços familiares. A saudade, palavra recorrente. A missa, como se ia ouvindo de boca em boca, foi bonita. Os cânticos, fundamentais apontamentos. Seguram-se, aqui e ali, lenços brancos que enxugam as lágrimas teimosas. Não é fácil. E penso nisso, enquanto olho para o marido e para os descendentes na primeira fila. Não é fácil sentar naquele lugar. Como não foram fáceis os últimos dias, os meses que antecederam a morte demorada. Aquele lugar tem um peso que não tem competição. É chegado o momento que também a fez tremer ao longo de toda a cerimónia. De vestido negro, saltos altos e um rosto caído, a filha, minha prima distante, avança na leitura do discurso preparado. Não lhe conheço, senão a cara e o nome. Se noutro tempo trocámos palavras, já me esqueci. Aludiu à vida cheia da mãe, ao amor aos seus, à entrega às causas em que acreditava, sempre carregada de humanidade. Dos meses frios até chegarem ali, da doença, do cancro. Foi, ao longo de cada palavra dita, exibindo um sorriso. Não chorou. Transbordaram, contudo, as emoções. Não sei se é sempre assim, mas há emoções que passam a mensagem, mesmo que olhes fixamente para as tábuas velhas, ou para os pés que não têm sossego. Fechou-se a grande porta. O resto, já sabemos. É saudade e, como lembrou o filho no derradeiro instante, é parar hoje e ganhar balanço para amanhã.

1 comentário:

  1. .... não há palavras de consolo possíveis nestes momentos...
    O tempo trará revolta...saudade.... falta...
    depois lá trará.... resignação.... aceitação... e continuação..sem nunca perder a saudade de vista..
    Beijoss Real

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