Cruza
as pernas. Descruza as pernas. Volta a cruzá-las. Leva a mão ao cabelo
arranjado, todo puxado. Os olhos já são belos, ficam com a maquilhagem ainda
mais esbeltos. Os sapatos altos na outra mão. É admirável a confusão. O vestido
parece que voa e não tem descanso. Apetece-lhe da boca largar um palavrão.
Pensou no cigarro, mas já lá vai o tempo da iludida sensação. Aquieto-me, à
espera. Invento outro pensamento. Fotografo para passar o tempo. Os lábios
atraentes, no desenho da tentação. Fi-la ficar a preto e branco e liguei o
gira-discos. Tal como o aparelho, o disco do mais vintage. É maravilhoso guardar o retrato. Envia um beijo com a mão
e a postura é atrevida. Assim, neste frenesim, aconteceu neste dia e nos
restantes. Foi amor à primeira. Separação na data verdadeira. Ficámos amigos
para a vida inteira. E não me engano. Que o amor fora apertado e profundamente
sexualizado, mas a amizade é, no mínimo, um prazer danado. Talvez, também por
isto, não neguemos a admiração. E não desmentimos. Amar é partilhar. Mas não
será errado sugerir que amar é admirar. Pisca-me o olho desse jeito. E vamos
morrer com a amizade viçosa, a memória com genica e fruitiva prosa. E que nunca
nos falhe a música boa e o vinho de fina casta.
Sem comentários:
Enviar um comentário