Na
rua acontecem os mais inusitados acontecimentos. Uma guerreia canina, que afugenta
transeuntes como se a maior hecatombe viesse no seu encalço. Com direito a
latidos fortes, dentes afiados e desespero nos olhos, até ao sossego final. Uma
mulher apresenta-se desgovernada, vociferando como se o mundo tivesse mudado. O
seu, pelo menos. Carregada de sacos gastos, cheios de coisas. Chamam-lhe
desabrigada, tonta e incapaz. A mim, inculto social, chamar-lhe-ia mulher sem
norte, consequência de uma vida que terá perdido. Ambienta-se, por ora, aos
novos moldes. À nova realidade. Anda com a passada larga, olha para o céu e
para o chão, vezes que não somos capazes de contar. Até que a perdemos de
vista. Paz é o que me apraz desejar. A calçada portuguesa atraiçoa alguns, elas
imitam a certeza de que estão sobre uma corda tão bamba. As cores ímpares fazem
o resto. Os tuk-tuk parecem flechas
por entre as ruas exíguas. Uma jovem de vestido airoso dá voltinhas à frente do
telemóvel, arrisco que vai sair mais uma publicação no Instagram. A correria habitual é ponto certeiro. Vêem-se
bicicletas, poucas, mas é um sinal da evolução dos dias. Um carteiro grita à
porta de uma loja de comércio local e assoma-se uma senhora de cabelo arrumado
e elevado a instalação. Por cima, janelas velhas, quase trancadas. Imagino a
solidão fechada a sete chaves. Na entrada de um prédio alto, espaço de uma
série de negócios, estão homens com fatos engomados, mulheres de saltos altos.
Trocam ideias na pausa para fumar. Nisto, estou quase a chegar. Sou um deles,
desta sociedade cuja roda não cessa. As pessoas também ficam a ver-me passar.
Atentas ou simplesmente esquecidas.
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