As
redes sociais são um atrevimento. Rasgam-se palavras amargas sobre o voyeurismo
na televisão, mas há sempre quem nunca desista de bisbilhotar online o que foi
feito desta ou daquele. Democratizou-se a o interesse pelo alheio. Tanto, que
já quase ninguém se lembra do passado. A
sério, risca essa merda toda e nunca mais voltes a fazê-lo. Terminou assim.
A miúda que só precisava de umas botas amarelas, umas meias rasgadas, mas sempre negras e um cabelo muito comprido
e super liso. Andava sempre com uma mala XXL e nunca parecia contente. Nunca
lhe vi um sorriso, nunca lhe ouvi a voz antes desta frase. Pintava os lábios
grossos de encarnado e tinha os olhos sempre escuros. Nunca tinha companhia e
arrastava-se pelos corredores. Só me lembro disto. Antes, claro, de ouvi-la
pela primeira vez. Depois de vê-la indignada com aquela outra miúda, voltei a
encontrá-la sempre da mesma forma, algures num ponto daquele corredor largo.
Vim, mais tarde, a saber que era uma aluna de excelência. Parte dos professores
tinha uma simpatia extrema por ela. Na minha opinião, com todo o mérito. Seria
um ano mais velha do que eu. Por isso, desde que terminou os estudos, nunca
mais a vi. Soube esta semana, através de uns amigos, que é uma jovem mulher igualmente
misteriosa. Continua bonita, de lábios encarnados. Agora é profissional da área
da justiça e não lhe faltam elogios. Sequer conversamos uma vez, mas fiquei
contente por saber dela e do percurso profissional. A outra miúda, com quem
ouvi-a gritar, parece que foi um amor de juventude. É uma fortuna ter o mundo
em andamento e sangue a fluir a favor do caminho certo.
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